quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Entrevista: Sérgio Fantini


Foto: Canniggia de Carvalho
  Em passagem por Natal para o lançamento do seu livro Silas pelo selo Jovens Escribas, comandado pelo escritor potiguar Carlos Fialho, o autor mineiro Sérgio Fantini concedeu uma entrevista ao grupo PET Literatura do Rio Grande do Norte de Letras da Universidade Potiguar – UnP. Numa entrevista descontraída, Fantini falou sobre a sua relação com a literatura e sobre o seu novo livro. 

PET: O seu livro, Silas, é o resultado da junção da novela “Diz xis” e mais quatro contos com o mesmo personagem. Por que resolveu reunir os contos e a novela num livro só, uma vez que eles foram publicados em anos e livros diferentes? Existe uma relação entre eles?


 Sérgio Fantini: A relação principal que existe é o próprio personagem. Esse livro Silas é a biografia desse personagem. Agora, em 2011, faz 20 anos que eu publiquei a novela "Diz Xis", e quando pensei em republicar a novela para comemorar esses 20 anos e comemorar os meus 50 anos de idade, me lembrei que tinha mais dois contos com Silas, dois contos mais recentes que são "Silas 30 do 2º tempo" e "Silas 10". Esse "Silas 10" foi publicado no meu último livro de 2008, que se chama A ponto de explodir, e “Silas 30 do 2º tempo” estava inédito. Quando eu juntei estes três momentos de Silas eu falei: "tenho quase que uma biografia", porque no "Diz xis" o personagem tem uns 18 anos, em “Silas 30” ele tem 30 anos e em “Silas 10” ele tem 50. E enquanto eu estava revisando e pensando nesse personagem, fazendo uma revisão dele e da minha própria experiência literária, me lembrei desses dois outros contos que eu tinha publicado na Antologia contos jovens, da Editora Brasiliense, de 1976, e me dei conta que o personagem desses dois contos já era o Silas. Ele nasceu com o nome de Alberto da Fonseca Júnior, tinha outro nome, mas era o mesmo personagem. Aí eu falei: "Pô, ele já era o Silas, o cara!", então eu reescrevi esses dois contos também e agora eu tenho o livro Silas com a mãe dele contando uma historinha de quando ele tinha perto dos dezoito anos; tem um conto escrito pelo Silas, que ele escreveu para mandar para um concurso, depois vem "Diz xis" que é ele próprio contando uma aventura que viveu no carnaval e depois o Silas dos 30 e 50 anos. Então montei uma biografia com o interesse de só republicar o "Diz xis", que seria uma questão para minha satisfação, para comemorar meu aniversário. Pensei até em fazer independente, por minha conta, uma tiragem pequena, uma coisa minha, para os meus amigos, porque o "Diz Xis" foi muito bem recebido em 1991. Recebi comentários positivos do Rubens Fonseca, do Raduan Nassar, praticamente todos os meus companheiros de geração, todo mundo gostou muito, foi muito legal. Eu ia fazer isso, mas, quando montei essa biografia, vi que tinha um conteúdo maior, e nesse momento eu já tinha conversado com o meu amigo Carlos Fialho, que é o editor da Jovens Escribas, e ele topou a idéia e a gente fez uma parceria para colocar a biografia de Silas na rua.

PET: Fale um pouco sobre "A Ponto de Explodir".

Sérgio Fantini: A ponto de explodir é uma reunião de contos que eu vinha escrevendo no ano de 2005, 2006, 2007, e publiquei em 2008. É uma coletânea de contos, não tem uma unidade temática, são contos escritos por mim em determinado período e que também foram muito bem recebidos. E depois vem o "Silas 30" o "Silas 10".

PET: Como é que você se tornou escritor?  

Sérgio Fantini: Eu comecei publicando poesias, escrevendo poesias quando eu tinha 9 anos de idade, e fui escrevendo, escrevendo, e me dei conta de que tinha um trabalho de literatura. Quando eu estudava, no Colégio Batista, mineiro, o professor Albanito, a quem dedico o Silas, porque é um livro de resgate, foi muito importante para mim. Porque eu fazia poemas, mas não tinha consciência de que fazia literatura, era uma coisa pessoal só, era uma satisfação pessoal escrever os poemas que eu escrevia. O professor Albanito mandava a gente fazer redação toda semana, fazer jogral, ler. Toda a semana, eu tinha livro para ler e, sem saber, ele foi o meu formador como escritor, ele me deu consciência do que eu fazia. Fui aluno dele em 1974, 1975, uma coisa assim, e, em 1976, eu fiz um folhetim de poesia por xerox na firma onde eu trabalhava. Com isso conheci algumas pessoas que tocavam violão e escreviam poemas,e a gente formou um grupo, o grupo Canções. A gente fez show, participou de festivais, de apresentações de poesias, de teatro, a gente fez um grupo mesmo de arte e resolvemos, em 1979, fazer um livrinho. Eu fiz o meu primeiro livrinho e dois colegas também, mas esses dois não escrevem mais, só eu continuei. Então como tive uma resposta muito boa desse primeiro livro, continuei a publicar, me tornei escritor, me assumi, percebi melhor o que eu fazia quando publiquei esse livro em 1979, que era de poesia. E desde essa época, quis escrever prosa, mas só consegui em 1985. Durante todo esse período, entre 1979 e 1985, publiquei sete livros de poemas e depois publiquei mais dois, em 1997, resgatando o material que ficou inédito desse período. Depois em 2002, pela editora do Joca Terron que queria publicar alguma coisa comigo, a gente fez Coleta seletiva, livro com os melhores momentos dos oito livrinhos que eu tinha publicado até então. 

PET: Pretende publicar poesia?

Sérgio Fantini: Por enquanto não, como diz o Marcelo Aquino “deixa a poesia para os verdadeiros poetas”.
 
PET: Qual o sentido da literatura na sua vida?

Sérgio Fantini: A literatura é a minha vida, o que existe de importante para mim, minha relação com o mundo é através da literatura. Eu tenho também um trabalho como produtor cultural desde 1976, mas na literatura é onde me realizo, me entendo, me comunico com o mundo. O que dá sentido para mim é escrever e conseguir escrever, não só publicar, mas o próprio ato de escrever. A minha realização se dá na consumação de um texto literário. E o trabalho com a linguagem é tudo também, a literatura é linguagem, literatura não é só um monte de histórias interessantes. Literatura para mim é um trabalho de linguagem. Eu dou oficinas de literatura em Belo Horizonte há algum tempo e falo isso o tempo inteiro para as pessoas, porque elas chegam querendo escrever para contar histórias de suas vidas. Você pode contar o seu caso, mas, se não trabalhar a linguagem, você não está fazendo literatura. Então o meu trabalho com a linguagem é extremamente obsessivo, o que eu puder ter de recursos que possam render, que possam ser úteis para o meu texto, eu tenho. Sou um revisor obcecado também, eu reviso os textos que estão saindo. Agora em Silas, textos, que já tinham sido publicados, foram relidos umas vinte vezes, até o último momento, eu estava mudando vírgula. Eu sonho, eu fico obcecado até a hora de publicar.

PET: Qual a sua opinião a respeito do ensino da literatura na escola?  

Sérgio Fantini: Eu acho que tudo o que é feito pela literatura é relevante. Eu estava conversando hoje com Carlos Fialho, que é preciso que a gente discuta cada atividade que se faz com a literatura, quando se escreve um poema, quando se escreve um texto, quando se publica, quando se faz um sarau, festival. Qualquer coisa que se faça pela literatura, disputando espaço na cabeça das pessoas, é relevante, porque tem muita coisa no sistema que está dizendo para você: “não leia”, “literatura não é relevante”, “vá jogar vídeo-game”, “vá jogar futebol”, “vá nadar”, “vá comprar uma roupa nova”, “vá passear no shopping”, “vá ver televisão”, “faça um monte de coisa”. “nunca leia”, “nunca escreva”, “nunca tente se expressar através da literatura”. Então quando a gente faz alguma coisa com a literatura a gente está tentando passar o que a gente acredita que é bom. Então o ensino da literatura, ensino formal, é positivo que exista e, assim como qualquer outra coisa sujeita a variações, ela pode ser boa e pode ser ruim. Tem uma crítica já bastante aceita de que a literatura no ensino fundamental, ensino médio, não é boa porque colocam autores que não dialogam com a cabeça da moçada, como foi o meu caso também. A gente lê coisas que não têm a ver com o que a gente está vivendo, e o que o jovem vai pensar, “literatura é um porre”, “não quero saber desse negócio”, “só tem coisa chata”, “é tudo horrível”, “literatura é chata”, “não quero mexer com eles, prefiro curtir um outro lance, sacou?”. E não é assim, a literatura pode ser prazerosa, o ensino da literatura pode ser prazeroso desde que seja feito um diálogo mais eficaz, principalmente com a mentalidade da juventude, para crescerem com o prazer da literatura, que é um super prazer. A gente, que já passou pela experiência, sabe que é prazeroso ler, escrever, e, no entanto, muitas vezes no ensino é colocado como uma coisa chata, assim como a gramática, que eu acho que a gente aprende muito cedo. É como ensinar como o seu fígado funciona, a criança vai ficar apavorada. Assim é a linguagem, a linguagem é prazerosa, é bonita, mas eles falam com a gente logo cedo “oração subordinada, oração coordenada sintética”, “que diabos é esse trem?”. Quando a gente é menino a gente tem que aprender o prazer da comunicação, da frase bem construída, do verbo, isso que é bacana. Então o ensino da literatura, voltando à sua pergunta, pode ser muito bom, desde que ele seja feito num diálogo mais competente com a mentalidade do estudante. 

PET: É possível viver só de literatura?  

Sérgio Fantini: Tem gente que vive só de literatura, mas, lembrando, que só de literatura significa um conglomerado de atividades, porque só de direito autoral é muito difícil. Eu tenho amigos que analisam isso, trabalham em editoras, que estão por dentro dos bastidores do mercado, e afirmam categoricamente que só de direito autoral quase ninguém ou pouquíssima gente vive. Porque direito autoral são 10% do preço de cada livro. Então para alguém ganhar, para pagar as contas, três mil reais por mês, imagina quantos livros ele tem que vender por mês, é uma enormidade. O que acontece é que as pessoas que se dedicam a viver só de literatura fazem orelhas, prefácios, antologias, cobram por cada palestra, que é um trabalho. Elas têm uma renda no periférico da literatura, que é uma coisa super bacana, uma coisa legal, as pessoas assumirem que vão viver disso, traduções, enfim, várias possibilidades de ganho através da literatura.  

PET: Literatura?

Sérgio Fantini: Prazer.

PET: Inspiração?  

Sérgio Fantini: Não existe.  

PET: Personalidade?
 

Sérgio Fantini: Que seja forte.

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