terça-feira, 3 de junho de 2014

Café com Letras: Rizolete Fernandes




Rizolete Fernandes natural da cidade de  Caraúbas, é bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN (1977). Em 2004, lançou A história oficial omite, eu conto: mulheres em luta no RN, livro sobre a militância feminista no Rio Grande do Norte. Em 2006, publicou o primeiro livro de poesia Luas Nuas, ao qual se seguiram Canções de abril, também de poesia, e Cotidianas, livro de crônicas. O último livro publicado Vento da tarde. Viento de la tarde  foi lançado em 2013,  em primeira mão, em Salamanca. Nesta entrevista, a autora discorre um pouco sobre sua vida como militante feminista e  sobre o fazer poético.

PET- Quando nasceu a poetisa? Quais são as suas influências?

Rizolete: Minhas primeiras leituras foram os folhetos de cordel, facilmente encontrados em cidades do interior, como Caraúbas-RN, de onde venho. Depois, passei a ler tudo o que me caísse às mãos, sobretudo romance. A poetisa nasceu desde que eu comecei a sentir necessidade de escrever e, ao fazê-lo, sempre me expressei na forma de poesia, poeticamente. Mais tarde, já em Natal, eu li a poesia de Auta de Souza, Myriam Coeli, Cecília Meireles, Franklin Jorge, Drummond, Vinícius, Ferreira Gullar, Pablo Neruda, Pessoa e outros. E continuei lendo, tanto poesia, como prosa. Eu concordo quando se diz que o escritor é a consequência de tudo que lê.


PET- Você ajudou na criação de grupos feministas no RN. Como se deu o início desses grupos e qual a participação das intelectuais de Natal?

Rizolete: Podemos afirmar que o surgimento do movimento feminista no Rio Grande do Norte se deu paralelamente ao fortalecimento do movimento feminista no Brasil e mundo e, no caso brasileiro, junto com a luta contra a ditadura, instalada com o golpe civil/militar de 1964. Faço questão de frisar que o pioneirismo do RN na conquista do voto feminino foi decorrência da campanha sufragista encabeçada pela paulistana Bertha Lutz, que, em ação junto aos parlamentares no Congresso Nacional, “convenceu” o Deputado e futuro Governador do RN, Juvenal Lamartine, a adotá-lo, no final da década de 1920, não sendo, portanto, como afirmam por aí, consequência de lutas das norte-rio-grandenses – lutas que não existiam, à época.
No fim da década de 1970 e por todos os anos 80 e seguintes, surgiram o Centro da Mulher Natalense, iniciativa da estudante de Direito, Rossana Sudário e, em seguida, o Movimento Mulheres em Luta, a União das Mulheres de Natal, o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, o Grupo Autônomo de Mulheres e o Coletivo Leila Diniz, dos quais deixei de participar, apenas, da criação do primeiro que, em 1982, fundiu-se com o Mulheres em Luta. Claro que outros grupos surgiram, ao longo desse tempo, mas, desde que me afastei do dia-a-dia do movimento, a partir dos anos 2000, não tenho acompanhado essa dinâmica.
Respondendo à segunda parte da pergunta, no início, o feminismo encontrava resistência em alguns setores da sociedade, como costuma acontecer diante do novo. Poucas jornalistas, como Ana Maria Cascudo e Graça Pinto, abriam espaço para o movimento. Em 1981, um grupo de professoras da UFRN, coordenado pela Professora Ângela Tygel, realizou o Seminário “Mulher em Debate”, tendo como palestrantes Wani Teixeira, Dalcy Cruz, Renira Lucena, Perpétua Wanderley, Maria Bezerra, Salete Machado, Ruth Dantas, Sarita Moysés, Socorro Trindad e Zélia Mariz, que teve enorme importância para nós, iniciantes no movimento.
Depois disso, continuamos contando com o apoio da Professora Dalcy Cruz e eventualmente, a colaboração de Maurinete Silva, Vera Pestana Rocha, Diva Cunha e, de modo definitivo, de Elizabeth Nasser, que, por ocasião do evento de 1981, se encontrava fora do país e, no retorno, incorporou-se à luta, da qual não mais se afastou. Mas, de um modo geral, o pessoal da cátedra se interessou mais tarde pelo feminismo, preferindo a produção de ensaios e teses sobre o tema.
Fora dessa instituição e além da colaboração feminina, contávamos com a solidariedade masculina, como o escritor e jornalista Nelson Patriota, que noticiava os eventos do movimento, os sociólogos Lincohn Moraes e Manoel Duarte contribuíam com as discussões teóricas e 33 entidades da sociedade civil subscreveram os documentos do I Encontro Estadual da Mulher, de 1982.  


 PET- Como você vê a poesia feminina no RN?

Rizolete: Com otimismo. A poesia no RN tem uma produção de boa qualidade, digna de ser bem apreciada por quem a estude. Uma tradição que teve início com Auta de Souza (1876 - 1901) e tem se mantido ao longo do tempo, basta ver a atual safra de novas poetisas.

PET - Qual foi a sensação ao lançar o livro Vento da tarde, em Salamanca, onde ocorreu um encontro tão importante, no qual estavam presentes 50 poetas de 12 países?

Rizolete: Salamanca/Espanha foi a viagem da minha vida literária, pois tive a oportunidade de ver minha poesia dar um salto diretamente do RN para a Europa, sem passar por outras regiões brasileiras, onde, aliás, também desejo um dia estar. E da Espanha, espalhar-se para os países presentes ao XVI Encontro de Poetas Ibero-americanos, como Colômbia, Chile, Cuba, entre outros países latinos, além de Portugal e Japão. Meu tradutor espanhol, o poeta e professor da Universidade de Salamanca, Alfredo Pérez Alencart, por sua vez, fez chegar meus poemas à poetisa búlgara Helena Boncheva, que traduziu alguns para sua língua.


PET- Você acha que o escritor deve intervir na sociedade?

Rizolete: Claro que sim, como cidadãos e cidadãs, nós todos temos, ou deveríamos ter, responsabilidade perante a sociedade. Podemos, então, veicular nossas ideias através da literatura, no caso dos poetas, através dos seus versos. O escritor não é nenhum ser iluminado, pairando acima dos outros seres, mas alguém que, vivendo em sociedade, deve intervir, se colocar politicamente, visando transformá-la para melhor, sempre buscando aperfeiçoar – no nosso caso – a jovem democracia brasileira.


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